Cultura machista de caminhoneiros contribui para disseminar o vírus da Aids
A enfermeira Evely Pereira Koller já sabia que os motoristas de caminhão não se preocupam com a possibilidade de contrair o HIV, o vírus da Aids, duas vezes mais comum entre eles do que no restante da população. Quase metade jamais usa preservativo com a própria mulher e outro tanto só o usa às vezes com as namoradas ocasionais. Para entender por que adotam esse comportamento e se arriscam a contrair doenças sexualmente transmissíveis, ela e outras quatro pesquisadoras da Universidade do Vale do Itajaí (Univali), em Santa Catarina, conversaram longamente com os caminhoneiros que entram e saem do porto de Itajaí, um dos maiores do país, no litoral norte catarinense – são mais de 500 por dia. Em busca de uma visão mais completa, ouviram também funcionários de postos de combustíveis e garotas e garotos de programa.
A equipe de Evely descobriu que parte do comportamento dos caminhoneiros de Itajaí pode ser explicada pela pressão do trabalho e pelos prazos curtos para percorrer longas distâncias, além da falta de unidades de atendimento médico preparadas para lidar com eles. Pesam também a cultura machista que predomina entre os caminhoneiros e a solidão das estradas, evidente em depoimentos como o deste motorista de 27 anos: Os caminhoneiros são uma espécie de soldado em guerra, sabe?, quero dizer, eles passam de duas semanas a seis ou oito meses sozinhos, fora de casa... Meu Deus, para um cara desses, qualquer mulher é gostosa.
Apresentado na Aids Care de julho de 2006, o resultado dos três anos de andanças desse grupo da Univali alerta para a necessidade de novas medidas para reduzir o risco de contaminação pelo HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. “Talvez seja preciso mais do que campanhas educativas tradicionais que explicam aos caminhoneiros por que é preciso usar camisinha nas relações sexuais fora de casa”, comenta Evely.
“Talvez seja necessário criar campanhas educativas para as mulheres desses motoristas para que comecem a aceitar um casamento aberto e passem a colocar preservativos junto com as roupas do marido antes da viagem, protegendo, assim, a elas mesmas.” Monica Malta, epidemiologista da Fundação Oswaldo Cruz que participou desse estudo, acrescenta: “É difícil acreditar que, mais de duas décadas depois de identificados os primeiros casos de infecção pelo HIV, muitas pessoas ainda não se sintam vulneráveis, embora façam sexo desprotegido e usem drogas”.
A equipe de Evely descobriu que parte do comportamento dos caminhoneiros de Itajaí pode ser explicada pela pressão do trabalho e pelos prazos curtos para percorrer longas distâncias, além da falta de unidades de atendimento médico preparadas para lidar com eles. Pesam também a cultura machista que predomina entre os caminhoneiros e a solidão das estradas, evidente em depoimentos como o deste motorista de 27 anos: Os caminhoneiros são uma espécie de soldado em guerra, sabe?, quero dizer, eles passam de duas semanas a seis ou oito meses sozinhos, fora de casa... Meu Deus, para um cara desses, qualquer mulher é gostosa.
Apresentado na Aids Care de julho de 2006, o resultado dos três anos de andanças desse grupo da Univali alerta para a necessidade de novas medidas para reduzir o risco de contaminação pelo HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. “Talvez seja preciso mais do que campanhas educativas tradicionais que explicam aos caminhoneiros por que é preciso usar camisinha nas relações sexuais fora de casa”, comenta Evely.
“Talvez seja necessário criar campanhas educativas para as mulheres desses motoristas para que comecem a aceitar um casamento aberto e passem a colocar preservativos junto com as roupas do marido antes da viagem, protegendo, assim, a elas mesmas.” Monica Malta, epidemiologista da Fundação Oswaldo Cruz que participou desse estudo, acrescenta: “É difícil acreditar que, mais de duas décadas depois de identificados os primeiros casos de infecção pelo HIV, muitas pessoas ainda não se sintam vulneráveis, embora façam sexo desprotegido e usem drogas”.
De modo geral, quem vive ao volante de um caminhão mantém relações sexuais com mais de uma pessoa. Os próprios caminhoneiros atribuem esse comportamento às condições de trabalho e à cultura da própria profissão. Muitas vezes eles têm de esperar durante dias no porto até deixarem uma carga ou conseguirem outra. Sem ter o que fazer, já há semanas longe de casa, não é difícil arrumar uma companhia, uma vez que, dizem, o assédio de garotas de programa é intenso. É um motorista de 49 anos que conta: Há, digamos, uma espécie de perseguição, sabe? Essas mulheres vão atrás da gente. E nós somos seres humanos, meu Deus! Elas começam assim: “Ei, querido, quer se divertir?” O que você faria? A gente simplesmente não consegue resistir...
O que mais preocupa Evely não é a questão moral de um homem ter amantes – mulheres, homens ou travestis – e trair sua mulher, mas o fato de seus hábitos sexuais os tornarem altamente vulneráveis a contrair doenças sexualmente transmissíveis e contaminar outras pessoas em regiões distantes. “Os caminhoneiros funcionam como uma população-ponte para os vírus”, observa Monica.
A cultura machista se soma ao desprezo pelas possíveis conseqüências do sexo sem proteção – e assim os caminhoneiros se sentem menos vulneráveis. “Eles nunca pensam que também pode acontecer com eles”, diz Evely. Como conseqüência, os homens da estrada adotam critérios pouco confiáveis tanto para escolher as parceiras quanto para decidir se é seguro fazer sexo sem preservativo. Uma garota num restaurante, numa lanchonete, ela é meio que diferente. Você pode confiar nela..., afirmou um dos motoristas entrevistados. A falta de acesso aos serviços de saúde agrava esse quadro de desinformação sobre as doenças sexualmente transmissíveis e outras enfermidades comuns aos motoristas, como o diabetes e a hipertensão.
“Esse comportamento não é exclusivo da região de Itajaí”, afirma Helena Lima, psicóloga com doutorado em saúde pública. De 2002 a 2005 ela coordenou um estudo nacional, financiado pelo Ministério da Saúde e pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, confirmando o que há quase dez anos as sanitaristas Regina Lacerda e Neide Gravato haviam observado no porto de Santos, o maior do país, por onde passam diariamente de 2 mil a 5 mil caminhões.
“Os hábitos sexuais e de consumo de álcool e drogas são sempre os mesmos nas cidades portuárias”, conta Regina, técnica da Secretaria Municipal da Saúde de Santos e integrante da organização não-governamental Associação Santista de Pesquisa, Prevenção e Educação (Asppe), que trabalha com portadores de HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Durante três anos Regina e Neide reuniram agentes de saúde, mapearam o comportamento sexual dos caminhoneiros do porto de Santos e iniciaram campanhas de orientação sobre doenças sexualmente transmissíveis e outros problemas de saúde, em parceria com os sindicatos dos caminhoneiros e dos trabalhadores do porto.
Tamanha mobilização andou um tanto e, depois, parou. “Nada mais foi feito de modo sistemático desde 2003”, lamenta Regina, que ainda tem razões para se preocupar com a situação. Ela acaba de concluir um estudo com 175 garotas de programa do Porto de Santos mostrando que 5,7% carregam o HIV no sangue. É uma taxa semelhante à de quase 20 anos atrás, quando começaram os programas de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis nos portos.
“O porto é o centro de um grande corredor de transporte, que facilita a circulação de doenças”, diz ela. “Como ali não há tempo para preocupação com a saúde, o trabalho de prevenção deve ser constante, com oferta de informações, preservativos e de testes rápidos para detectar o HIV.”
Em Itajaí, Evely insiste em reuniões com caminhoneiros e garotas de programa a fim de verificar se são capazes de, por conta própria, envolverem-se em campanhas para evitar a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis e de exigirem a implantação de serviços de saúde nas estradas e nos portos.
O que mais preocupa Evely não é a questão moral de um homem ter amantes – mulheres, homens ou travestis – e trair sua mulher, mas o fato de seus hábitos sexuais os tornarem altamente vulneráveis a contrair doenças sexualmente transmissíveis e contaminar outras pessoas em regiões distantes. “Os caminhoneiros funcionam como uma população-ponte para os vírus”, observa Monica.
A cultura machista se soma ao desprezo pelas possíveis conseqüências do sexo sem proteção – e assim os caminhoneiros se sentem menos vulneráveis. “Eles nunca pensam que também pode acontecer com eles”, diz Evely. Como conseqüência, os homens da estrada adotam critérios pouco confiáveis tanto para escolher as parceiras quanto para decidir se é seguro fazer sexo sem preservativo. Uma garota num restaurante, numa lanchonete, ela é meio que diferente. Você pode confiar nela..., afirmou um dos motoristas entrevistados. A falta de acesso aos serviços de saúde agrava esse quadro de desinformação sobre as doenças sexualmente transmissíveis e outras enfermidades comuns aos motoristas, como o diabetes e a hipertensão.
“Esse comportamento não é exclusivo da região de Itajaí”, afirma Helena Lima, psicóloga com doutorado em saúde pública. De 2002 a 2005 ela coordenou um estudo nacional, financiado pelo Ministério da Saúde e pelos Centros de Controle e Prevenção de Doenças (CDC) dos Estados Unidos, confirmando o que há quase dez anos as sanitaristas Regina Lacerda e Neide Gravato haviam observado no porto de Santos, o maior do país, por onde passam diariamente de 2 mil a 5 mil caminhões.
“Os hábitos sexuais e de consumo de álcool e drogas são sempre os mesmos nas cidades portuárias”, conta Regina, técnica da Secretaria Municipal da Saúde de Santos e integrante da organização não-governamental Associação Santista de Pesquisa, Prevenção e Educação (Asppe), que trabalha com portadores de HIV e outras doenças sexualmente transmissíveis. Durante três anos Regina e Neide reuniram agentes de saúde, mapearam o comportamento sexual dos caminhoneiros do porto de Santos e iniciaram campanhas de orientação sobre doenças sexualmente transmissíveis e outros problemas de saúde, em parceria com os sindicatos dos caminhoneiros e dos trabalhadores do porto.
Tamanha mobilização andou um tanto e, depois, parou. “Nada mais foi feito de modo sistemático desde 2003”, lamenta Regina, que ainda tem razões para se preocupar com a situação. Ela acaba de concluir um estudo com 175 garotas de programa do Porto de Santos mostrando que 5,7% carregam o HIV no sangue. É uma taxa semelhante à de quase 20 anos atrás, quando começaram os programas de prevenção às doenças sexualmente transmissíveis nos portos.
“O porto é o centro de um grande corredor de transporte, que facilita a circulação de doenças”, diz ela. “Como ali não há tempo para preocupação com a saúde, o trabalho de prevenção deve ser constante, com oferta de informações, preservativos e de testes rápidos para detectar o HIV.”
Em Itajaí, Evely insiste em reuniões com caminhoneiros e garotas de programa a fim de verificar se são capazes de, por conta própria, envolverem-se em campanhas para evitar a disseminação de doenças sexualmente transmissíveis e de exigirem a implantação de serviços de saúde nas estradas e nos portos.
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