sexta-feira, 21 de setembro de 2007

Os trabalhos de Sócrates


Quando olha para os dois primeiros anos de Governo, que hoje se cumprem, o candidato a analista independente tem dificuldades em fugir da metáfora do copo meio cheio ou meio vazio. O pessoal da oposição, os pessimistas, os cépticos dirão que entre as promessas e a realidade vai uma distância inaceitável – como muito bem fez este fim de semana o PSD, com a rábula dos "tesourinhos deprimentes" do "Gato Fedorento".
O pessoal da oposição, os pessimistas, os cépticos dirão que entre as promessas e a realidade vai uma distância inaceitável – como muito bem fez este fim de semana o PSD, com a rábula dos "tesourinhos deprimentes" do "Gato Fedorento".

Os adeptos do Governo, onde se incluem muitos socialistas mas não todos, os optimistas e os crédulos, dirão que se fez o que era possível fazer em dois anos, cumprindo os objectivos de controlar o défice e pôr a economia a crescer alguma coisa.

Sem fazer parte de um ou de outro grupo – pelo menos no que toca a fidelidades partidárias, porque quanto a ser céptico ou ingénuo, não se é grande juiz em causa própria –, o candidato a analista adopta a táctica do prof. Marcelo, e diz que o Governo merece um 13+.

A seu favor tem sobretudo a mão e o estilo de um rapaz normal e ambicioso – acreditar na biografia do Sol –, que às vezes se transforma em animal feroz. É a determinação de Sócrates (que pode ser lida como arrogância), a teimosia de segurar os ministros envolvidos em batalhas difíceis, sobretudo na Saúde e na Educação, que mantém a imagem do Governo junto dos portugueses. Isso e a eficaz e já consabida máquina de marketing político, que até agora tem funcionado sem falha.

O que é que o Governo fez? Disse aos portugueses que havia liderança, manteve decisões apesar da oposição, das manifestações e das greves, cumpriu as metas de redução do défice orçamental. Os pontos fracos são a frequente multiplicação de focos de conflito e o carácter incipiente das reformas, muitas vezes anunciadas. Nas carreiras da administração pública cumpriu na semana passada o compromisso de uma proposta de revisão, que por muito tímida que seja assume o fim do tabu do emprego para a vida na função pública, mas cujos efeitos práticos não serão visíveis antes de um par de anos.

É do PRACE, que prometia simplificar toda a orgânica da administração do Estado, que chegam os sinais mais inquietantes. Basta acompanhar, por exemplo, o que se passa em institutos públicos envolvidos na reforma, onde, a acreditar no que transpira, não está a passar-se rigorosamente nada. O PRACE arrisca-se a ser o maior flop deste Governo.

O candidato a analista independente tem de reconhecer que o Governo foi eleito para uma legislatura, pelo que ainda lhe restam dois anos para mostrar trabalho. Concretizar as reformas é um dos trabalhos mais importantes e a esse respeito chegaram de Belém, também em dia de aniversário, os primeiros sinais amarelos.

Mas o que será determinante para que Sócrates consiga renovar a maioria absoluta em Outubro de 2009, com o argumento de que precisa de mais quatro anos para completar o trabalho iniciado, será o desempenho da economia. Obviamente, estamos melhor hoje do que há dois anos mas ficar entusiasmado com um crescimento de 1,3% é contraproducente. Não só é insuficiente para criar emprego como mantém Portugal em divergência face à União Europeia. A receita mais fácil seria regressar ao programa dos grandes investimentos públicos mas já não vai a tempo. Claro, que entretanto começam a chegar os milhões do QREN. Uma ajuda que não dispensa Sócrates de continuar a seguir o caminho difícil. E não leva grande avanço.

Luisa Bessa

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