O Conselho Superior da Magistratura decidiu suspender preventivamente o juiz Hélder Fráguas pela suspeita da autoria de um blogue que contém linguagem considerada obscena e imprópria e instaurou um processo disciplinar ao juiz desembargador Rui Rangel devido a um artigo publicado no "Correio da Manhã" relativo ao caso Esmeralda.
No primeiro caso, o Conselho Superior da Magistratura (CSM) decidiu, numa reunião ordinária daquele órgão, realizada ontem, suspender o juiz Hélder Fráguas, que exerce funções no tribunal do Barreiro, mesmo antes da conclusão do respectivo processo disciplinar.
O magistrado fica impedido para já de exercer actividade como juiz-presidente do 2º Juízo Criminal do Tribunal do Seixal. Os processos que tinha entre mãos estão a ser transferidos para o seu substituto.
Fonte do CSM disse à agência Lusa que Hélder Fráguas pode recorrer, "se assim entender", da decisão, sublinhando que "todas as decisões do CSM são recorríveis".
Na mesma reunião, o CSM deliberou por maioria instaurar um processo disciplinar ao juiz desembargador Rui Rangel devido a um artigo publicado no "Correio da Manhã" relativo ao caso Esmeralda, relacionado com a disputa do poder paternal de uma criança de cinco anos que o pai adoptante, Luís Gomes, e o pai biológico, Baltazar Nunes.
O inquérito disciplinar pretende apurar se este juiz desembargador do Tribunal da Relação de Lisboa violou ou não o dever de reserva. No âmbito do Estatuto do Ministério Público, os magistrados "não podem fazer declarações ou comentários sobre processos, salvo, quando superiormente autorizados, para defesa da honra ou para a realização de outro interesse legítimo". Ainda segundo o estatuto, "não são abrangidas pelo dever de reserva as informações que, em matéria não coberta pelo segredo de justiça ou pelo sigilo profissional, visem a realização de direitos ou interesses legítimos, nomeadamente o do acesso à informação".
A decisão de abrir um inquérito disciplinar a Rui Rangel não se mostrou pacífico no seio do CSM, levando a uma discussão sobre os limites impostos pelo dever de reserva. O assunto ter-se-á revelado particularmente sensível tanto mais que o antigo ministro da Justiça Laborinho Lúcio, que é vogal do CSM, fez alguns comentários públicos sobre o caso Esmeralda. Por uma questão de "honestidade intelectual", Laborinho Lúcio pediu ontem que lhe fosse instaurado um inquérito sobre comentários proferidos numa entrevista ao canal 2 da RTP, em que comentou duas decisões judiciais no âmbito do caso Esmeralda.
Rui Rangel nega violação do dever de reserva
"Rejeito ter violado o dever de reserva", disse Rui Rangel à Lusa, considerando que o processo que lhe foi instaurado pelo CSM parte de "um pressuposto errado" — o de que o dever de reserva se aplica a todos os processos judiciais e não apenas aos que estão sob jurisdição directa.
Segundo o magistrado, o dever de reserva não pode ter "as costas de tal forma largas que acabe por impor uma lei da rolha" e colida com o direito à liberdade de expressão. Rui Rangel considera que este mecanismo não pode ser usado para impor censura e sente-se apenas obrigado ao dever de reserva em relação aos processos sob sua jurisdição. Nesse sentido, defende uma alteração legislativa nesta matéria e afirma ter conhecimento da disponibilidade do Tribunal Constitucional para analisar a questão.
O juiz desembargador afirma não abdicar do seu direito de opinião e diz que a expressou num caso que o chocou, assinalando que são conhecidas as diferenças de opinião com o vice-presidente do CSM, Santos Bernardino, a quem acusa de ter levantado a questão do artigo.
Rui Rangel acusou ainda o CSM de dualidade de critérios já que outros juízes e mesmo membros daquele órgão também se pronunciaram sobre o caso sem que tivessem sido alvo de qualquer processo. "A justiça já fez uma vítima [Luís Gomes], não quero ser mais uma", declarou o magistrado, que recusa ser "o bode expiatório" neste processo.
Associação Sindical dos Juízes não comenta
A Associação Sindical dos Juízes Portugueses entende que "não deve emitir opinião" sobre as decisões do Conselho Superior da Magistratura de instaurar inquéritos disciplinares aos magistrados Hélder Fráguas e Rui Rangel.
O presidente da associação, António Martins, considera que o organismo "não deve emitir opinião sobre matéria respeitante a questões disciplinares".
"De resto os processos disciplinares são matéria secreta e, como tal, desconhecemos o que esteve na base das decisões do CSM relativamente a estes dois casos", acrescentou o sindicalista, indicando que aguarda "o desenvolvimento e a conclusão destes processos, para só depois, se for caso disso, fazer alguma observação".
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