terça-feira, 18 de setembro de 2007

A pátria da banca


Desconfie dos unanimismos: se toda a gente diz que a OPA do BCP ao BPI está morta, duvide. Porque não está. Está é criado o clima de súplica ao Governo, para travar a La Caixa. Não é novo: os adeptos do mercado soçobram quando o mercado deixa de lhes ser favorável. E muitos dos que agora exigem ao Governo que impeça os avanços catalães são os que elogiaram Sócrates por não interferir na OPA à PT.
E muitos dos que agora exigem ao Governo que impeça os avanços catalães são os que elogiaram Sócrates por não interferir na OPA à PT. É moderno ser defensor das economias de mercado, mas não demasiado. Esta é melhor das teorias, cabe lá tudo. Não é ingenuidade, é mesmo cobardia.
Só que a La Caixa está ela mesma protegida do mercado, pois não pode ser comprada. Este é o grande argumento para contestar o Banco de Portugal na sua anuência ao aumento dos catalães no capital do BPI. Mas só os ingénuos esperariam outra coisa. O título do editorial deste jornal no dia seguinte ao lançamento da OPA dizia tudo: estava aberta "La Caixa de Pandora"...
Quem abriu a arca e libertou "todos os males" foi oBCP com a sua OPA hostil, não o Banco de Portugal. Querer agora a protecção do Estado só pode significar que o BCP conta com ela desde o princípio.
O BCP atirou-se ao BPI porque estava vulnerável a uma OPA (e está-o ainda, inclusive a uma contra-OPA). Mas sobretudo porque precisa de ganhar balanço para crescer, por exemplo na Polónia, onde a explosão económica, de negócios, de créditos à habitação e etc. vai exigir um capital que a actividade em Portugal já não permite fazer crescer.
A OPA não está morta mas está condicionada pela La Caixa. Se os catalães não quiserem vender, a operação está dificultada; mas se quiserem vender, a OPA fica mais fácil, pois encontra um grande bloco de acções num putativo vendedor. Pelo meio, parece claro, o BCPterá de subir o preço da oferta. Ou avançar com uma oferta pública de troca, como admite no prospecto, e dar acções e não dinheiro, entregando a liderança accionista do BCP+BPI aos catalães.
Este crescimento da La Caixa provoca mais pressão sobre a necessidade de aumento de preço pelo BCP, que por sua vez já encontrou aliado no "castelhano" Santander, que quer conter a expansão do seu concorrente, que de qualquer forma já não é o "parceiro silencioso" que deixou a gestão mandar no BPI. É uma ironia verificar que Ulrich e Santos Silva, que já esconjuraram a entrega de bancos a espanhóis, lhes abrem pela segunda vez a porta, depois da venda do BCI ao Santander.
O que recoloca a gestão: por que deve o Governo intervir?
Argumento 1: por serem portugueses os bancos ameaçados. Só que não o são. Tirando a CGD, onde não há equívocos, nenhum grande banco é, nem será, verdadeiramente português. O BCP tem o capital espartilhado (e dependente, diz Ulrich), o que dá o poder aos gestores; o BPI é detido por espanhóis, brasileiros e alemães, sendo que a La Caixa passou ou passará a dominar a gestão; e mesmo o BES, controlado pela família Espírito Santo, tem no francês Crédit Agricole uma parceria sensível.
Argumento 2: estes bancos, mesmo estrangeirados, mantêm o centro de decisão em Portugal. E o que têm feito o BCP e o BPI pelo País, que torne morte-ou-vida a questão da sua propriedade? O que devemos ao BCP e ao BPI, que até pagam taxas de impostos inferiores às da maioria dos contribuintes, é fazerem bem o seu trabalho, serem agressivos comercialmente, financiarem bons investimentos. Mas não devemos mais nem menos do que isso ao Santander.
Nos negócios, nacionalidade não é patriotismo e patriotismo é conveniência. O BCP quer a intervenção do Governo invocando o fantasma espanhol. Mas não basta ser compatriota para ser patriota. Por isso, desconfie dos unanimismos...

Pedro Santos Guerreiro

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