terça-feira, 18 de setembro de 2007

A missa da DGCI


A Missa de Acção de Graças que Paulo Macedo encomendou pela DGCI e pelos seus funcionários, e que hoje se realiza na Sé Patriarcal de Lisboa, é um extraordinário mau acto de gestão e prova de soberba do director-geral dos Impostos.
Pela primeira vez na sua história registada, a Direcção-geral dos Impostos manda rezar missa pelo desempenho dos seus funcionários e a todos convida à participação. Ao actuar assim, Paulo Macedo convenceu-se que lhe era próprio encabeçar a iniciativa, que a iniciativa era adequada como medida de inclusão dos trabalhadores, que a missa teria o mérito de mobilizar as equipas, que o assunto em nada feria a definição da sua função de dirigente do Estado.
Mas isto só serve como justificação para quem imaginar que Paulo Macedo entendeu o que entendeu apenas por distraída presunção religiosa.
Visto por dentro da convicção religiosa, como é normal numa Missa de Acção de Graças, tudo se passa de acordo com os princípios e os credos próprios da Igreja Católica e ninguém que partilhe estas convicções se sente estranha ao agradecer e encomendar ao divino a sua sorte passada e sua futura fortuna. Nem tão pouco estranha que Deus tenha tanta coisa a ver com a cobrança de impostos, com a eficácia da máquina fiscal, com o cumprimento da lei de um Estado, que tanta outra gente julga ser laico.
Mas exactamente por isto ser assim, por Paulo Macedo ser católico e obviamente uma pessoa inteligente e reflectida, por ter consciência do lugar que ocupa no Estado, por saber o Estado em que vive, por saber que a DGCI nunca encomendou missas, por saber que uma missa une os católicos da DGCI mas afasta todos os outros funcionários, por saber que a despenalização do aborto está a um mês de distância, por saber que o seu salário está novamente de volta à imprensa, o facto é que Paulo Macedo tem consciência de que está a esticar a corda e não está a praticar um acto de gestão.
Porque se fosse um acto de gestão, apesar de ser uma mau acto de gestão, então seria obrigatório o director-geral encomendar missas em muitos outros credos, pelo menos tantos quantos os que são reconhecidos pelo Estado e passíveis de ensino nas escolas públicas.
Mas como é evidente, um acto de gestão que separa os trabalhadores por credos religiosos é uma acto de cisão irracional, prejudicial à eficácia dos grupos de trabalho, ilógico do ponto de vista motivacional, imprudentemente segregador.
É claro que ao Estado português não hão-de faltar casos anteriores, noutros organismos, em que os dirigentes se envolveram pessoalmente em actos religiosos dirigidos ao colectivo dos trabalhadores e à organização e que não mereceram qualquer notícia na imprensa.
Mas também é evidente que a quantidade de maus exemplos não só não legitima novos casos, como se trata de situações invisíveis para a comunicação social. Todas os actos religiosos praticados em nome do Estado são ilegítimos e como tal devem ser tratados.
É pois inaceitável que o Ministério das Finanças, dando cobertura ao sucedido, venha explicar que iniciativas como estas não põem em causa a laicidade do Estado.
Fernando Teixeira dos Santos terá de explicar como é que uma convocatória para uma missa que seguiu a cadeia hierárquica, transmitida de chefia para chefiados, não fere o princípio do Estado laico.

Eduardo Moura

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