terça-feira, 18 de setembro de 2007

Instituto levantou suspeita sobre regras do concurso


O Instituto de Telecomunicações (IT) alertou, em Maio de 2005, para o facto de as regras do concurso para o sistema de comunicações entre as diversas forças de segurança - SIRESP (Sistema Integrado das Redes de Emergência e Segurança de Portugal) - favorecerem "o(s) concorrente(s) com acesso a informação privilegiada". Num parecer enviado ao ministro da Administração Interna, António Costa, a que o DN teve acesso, três técnicos do IT afirmaram ainda que o prazo de entrega e elaboração de propostas foi muito curto (50 dias, que incluíram o mês de Agosto de 2003), o que poderia ainda impedir o aparecimento de mais do que uma proposta. Em causa estava um negócio de 600 milhões de euros.Este documento esteve, juntamente com outros (ver página ao lado), na base da decisão de António Costa de cancelar a adjudicação do contrato do SIRESP, renegociando o mesmo com o consórcio vencedor. O documento, subscrito por Carlos Salema, António Serra e Luís Correia, faz uma análise muito crítica sobre todo o processo à volta do concurso para o SIRESP, que remonta à Resolução 56/2003 do Conselho de Ministros. Foi após esta resolução que foram feitos convites, em 10 de Julho de 2003, para a elaboração de propostas para a concepção do sistema. O prazo terminou a 1 de Setembro de 2003, mas acabou por ser alargado por mais 15 dias a pedido de um dos interessados. Porém, apesar de terem sido convidadas cinco empresas, apenas uma apresentou uma proposta: o consórcio liderado pela Sociedade Lusa de Negócios (SLN), uma holding do Grupo BPN (Banco Português de Negócios).Os autores do parecer declararam que "não pode concluir-se de forma segura e inequívoca" que o caderno de encargos do concurso "tenha disposições que impeçam a concorrência e limitem o número de propostas apresentadas". Mas, salientam, "o prazo muito curto dado para a apresentação de propostas, num concurso tão complexo como o SIRESP, parece ter sido a razão determinante para a existência de uma única proposta".A "pressa" do então Governo liderado por Durão Barroso foi justificada com a realização do Euro 2004. Um evento que implicava o apetrechamento das forças de segurança portuguesas em matéria de comunicações. Porém, os técnicos do IT salientam que um concurso com esta complexidade deveria ter sido contemplado com um prazo de "90 a 120 dias" para a apresentação de propostas.O negócio entre o Estado e o consórcio acabou por ser viabilizado através de um despacho conjunto dos ex-ministros Daniel Sanches e Bagão Félix. Ambos se apoiaram num "parecer oral" de Mário Gomes Dias, então auditor jurídico do Ministério da Administração Interna, que enquadrou o despacho (três dias após as eleições legislativas de 20 de Fevereiro de 2005) como um acto de um Governo em gestão.Tráfico e acesso privilegiadoTal como o DN avançou ontem, as buscas realizadas na passada quinta-feira a quatro das cinco empresas do consórcio envolvido no negócio do SIRESP tiveram por base suspeitas de tráfico de influências, corrupção e favorecimento.Um dos envolvidos poderá ser Daniel Sanches (ver caixa nesta página), ex-ministro da Administração Interna, que durante os últimos meses do Governo liderado por Santana Lopes impulsionou a adjudicação do SIRESP. Num primeiro momento, o ex-ministro das Finanças Bagão Félix recusou-se a assinar o despacho, por entender que tal adjudicação não cabia nas competências de um Executivo de gestão (o presidente Jorge Sampaio dissolveu a Assembleia da República em Dezembro de 2004). Daniel Sanches esclareceu num artigo publicado no jornal Público que só adjudicou o concurso após o parecer de Mário Gomes Dias. O consórcio é formado pela Motorola, Inc., PT Ventures, SGPS, SA, SLN- Sociedade Lusa de Negócios, SGPS, SA, DATACOMP - Sistemas de Informática, SA, e ESEGUR - Empresa de Segurança, SA.

Carlos Rodrigues Lima

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