terça-feira, 18 de setembro de 2007

A Banda larga e os direitos de autor


A banda larga é um tema presente na maioria dos operadores móveis e, assim, aspectos como a pirataria, hacking e vírus nos telemóveis tornam-se questões fundamentais na área das telecomunicações. A experiência diz-nos que na banda larga por cabo é impossível parar a pirataria. Quanto mais complexos os esquemas de protecção, maior interesse existe em contorná-los.
Há também uma noção instalada de que roubar bits não é o mesmo que roubar outra coisa física, daí ser mais fácil acreditar que não é roubar. Por outro lado, não é razoável dizer que o download eventual de uma música não faz de uma pessoa um criminoso, que copia músicas ou filmes indiscriminadamente.
Quererá isso dizer que a protecção da propriedade intelectual (DRM), é um tema a ignorar? Nem pensar nisso! O DRM é muito importante na protecção dos conteúdos premium, que são os verdadeiros responsáveis pelo incremento de qualidade nos conteúdos. Quantos filmes teriam sido feitos se os cinemas tivessem entrada livre e os autores não recebessem nada em troca do seu trabalho? Existiriam DVDs com opções especiais desses mesmo filmes?
O melhor esquema de DRM que existe, actualmente, é na área dos livros. Porque existem em várias alternativas qualitativas, sempre com o mesmo conteúdo; têm um preço justo, ou pelo menos há a percepção de que têm um preço justo para a quantidade de trabalho envolvido; podem ser lidos à vontade pelo público em livrarias, antes de os comprarem. Não acredito que isto queira dizer que os livros estão para desaparecer e que é um negócio que está para acabar. A grande vantagem do material impresso, em relação aos conteúdos digitais, é que é demasiado inconveniente copiar um livro, embora seja perfeitamente possível. No entanto, é exactamente isso o que a protecção contra a cópia faz, em termos dos conteúdos digitais. Ao mesmo tempo que é pouco eficaz na protecção dos direitos de autor, prejudica imenso a experiência do comprador legítimo.
Eu lembro-me do dia em que deixei de comprar CDs. Não foi gradual, foi de um dia para o outro. Vi um CD de música, de uma banda portuguesa, que queria mesmo comprar. Quando peguei na caixa, vi que estava protegido contra cópia. Num sistema em que não era possível transferir as músicas para o meu leitor de mp3 ou ouvir o disco num PC, sem ser através de uma aplicação especial.
Nesse momento decidi que evitaria voltar a comprar um CD físico. Desde esse dia que compro toda a música na Internet. Sempre fui um grande consumidor de música e sempre comprei imensa. Por isso mesmo, não compreendo a posição das editoras ao quererem prejudicar a minha experiência de comprar, e ouvir música. Quem é que acredita que os esquemas de protecção prejudicam outros que não os legítimos compradores? Seria possível derrotar o esquema de protecção? Sem dúvida, mas se estou a pagar porque é que tenho de ter esse trabalho todo, se com dois cliques na internet, compro o mesmo conteúdo?
O paradoxal é que os maiores prejudicados com os esquemas de protecção da propriedade intelectual são as pessoas que se disponibilizam para comprar de uma forma legítima. Isso é o mesmo que o dono de uma mercearia dificultar a vida às pessoas que estão na fila para pagar, enquanto os ladrões saem pelas traseiras, com as compras do mês, debaixo do braço.
O equilíbrio apenas pode ser atingido, quando o esforço de copiar um conteúdo não compensar, relativamente ao custo de o comprar. A perseguição dos prevaricadores não funciona, por mais que persigam as pessoas e por piores que sejam as sanções.
Copiar conteúdos em formatos electrónicos é fácil. Não é como fotocopiar um livro. Mas o preço dos livros não é, absurdamente, caro. Quando o CD de uma banda sonora de um filme custa mais que o próprio filme em DVD, há alguma coisa errada nisto.
Com a banda larga a estender-se a mais casas e, em breve, até aos telefones, os problemas da indústria musical e dos filmes vão piorar. O segredo estará, provavelmente, em alinhar os incentivos das empresas de conteúdos com as expectativas dos clientes.
Neste momento, duas coisas preocupam os clientes que compram conteúdos em suporte digital: simplicidade e interoperabilidade. Isto é especialmente verdade nos telefones móveis. Esquemas de protecção intrusivos, e que limitam estas duas questões essenciais, não deviam ser a preocupação dos clientes, no momento da compra dos conteúdos.
A experiência de compra, e utilização, deve ser o menos dolorosa possível, para potenciar o comportamento da compra legítima.
Toda esta questão se complica quando estamos a falar de comunicações móveis, porque ainda é entendido como mais um meio de transmitir dados. Há uma percepção de que o operador é um misto de fornecedor de comunicação e de conteúdos enquanto que, na realidade, a maior parte dos conteúdos é fornecida por terceiros.
O dilema é que se os conteúdos estão a ser pirateados, ou copiados, nem o operador, nem o terceiro estão a receber o justo valor pelo conteúdo. Ou pior, o operador está a fornecer os seus clientes e a assumir todo o risco de não receber, enquanto têm de pagar ao seu fornecedor. Adicionalmente, os operadores estão a assumir sozinhos a percepção da qualidade do serviço.
Assim, os operadores devem concentrar a sua preocupação nos esquemas de receita relativos a conteúdos fornecidos por terceiros, com a fraude e com a crescente complexidade de cobrar os conteúdos aos clientes; e garantir a qualidade de serviço dos seus fornecedores, no auxílio aos seus clientes, e em defesa da sua imagem.
Nos novos paradigmas de comunicação, serão a capacidade de conseguir controlar a sua própria qualidade de serviço, bem como a sua mais relevante fonte de receitas, os factores diferenciadores.

Rui Cruz

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