terça-feira, 18 de setembro de 2007

Amor à camisola


427,5 milhões foi o número de mensagens que os portugueses enviaram uns aos outros nos quatro dias da "operação Natal" dos três operadores de telemóvel.
Em média, cada um de nós mandou dez mensagens por dia, que lhe custaram um euro – quatro euros em toda a quadra natalícia – a adicionar à factura telefónica. E a dose repete-se no final do ano, para deleite dos operadores.
A adesão nacional ao telemóvel já não é notícia e os SMS na quadra natalícia só se destacam porque, em cada ano, ultrapassa-se o recorde do ano anterior.
Só com muito boa vontade se poderá dizer, como já se ouviu, que o telemóvel é um indicador da facilidade com que os portugueses se adaptam às novas tecnologias. Se assim fosse, não era preciso Plano Tecnológico. Há que reconhecer, no entanto, que se os indicadores de iliteracia continuam a colocar-nos aos níveis do mundo menos desenvolvido, em matéria de telemóveis passa-se o contrário.
Os SMS impuseram-se como meio privilegiado para as mensagens de boas festas. Os correios, que já tinham perdido as cartas de namorados, num tempo em que já ninguém escreve cartas de amor, perderam agora os cartões de Natal.
É precisamente dos CTT que chega uma das imagens mais negativas, no inquérito que o Jornal de Negócios promoveu junto de mais de uma dezena de comissões de trabalhadores de grandes empresas portuguesas, e que pode ser lido a partir da página 26. Ao pedido de um comentário às respectivas lideranças, o presidente dos CTT, Luís Nazaré, que enfrenta a partir de hoje uma greve de três dias, teve direito ao comentário mais arrasador, sendo qualificado como um líder "fraco, muito fraco". Distingue-se pelo grau mas não pelo sentido, pois a avaliação geral é de tom negativo.
A acreditar na amostra, os representes dos trabalhadores são os piores embaixadores das respectivas empresas, com excepção da Autoeuropa, e, em menor grau, da RTP e da TAP. No retrato que fazem do ano de 2006 sublinham aspectos negativos e apresentam a realidade com uma linha divisória muito clara entre nós e eles, aqueles que têm por função gerir e a quem votam a maior desconfiança. Pelos seus relatos, a gestão é bastante mal frequentada e o ambiente nas empresas irrespirável.
Porque é que isto acontece? A explicação de que as comissões de trabalhadores continuam reféns de um espírito de luta de classes pode ser demasiado simplista e a prova é o depoimento de António Chora, da CT da Autoeuropa, que avalia positivamente e liderança e assume a empresa como sua.
A política alemã de participação dos trabalhadores na gestão das empresas, que agora está a ser criticada até no seu próprio país, na sequência dos escândalos de sacos-azuis e corrupção que abalam a Siemens, deve ter alguma coisa a ver com o assunto.
Uma parte do problema tem de estar dentro das empresas, em especial nas empresas públicas, onde a rotatividade dos gestores está associada às mudanças do poder político, gerando suspeitas de favorecimento, além de impedir o desenvolvimento de políticas estáveis e de uma relação de diálogo com os funcionários. Algo que Almerindo Marques e Fernando Pinto, apesar de estarem à frente de empresas do Estado, foram capazes de fazer.
O que não se percebe é como algumas das mais importantes empresas portuguesas podem viver de costas voltadas para os seus funcionários, ou uma parte significativa deles.
Sem amor à camisola.

Luisa Bessa

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