terça-feira, 18 de setembro de 2007

A globalização vista de Davos


A fábrica da Yazaki Saltano em Ovar encerrou uma linha de produção e com ela desapareceram mais 500 postos de trabalho. Nas reportagens que dão rosto à notícia, ouvimos trabalhadores desencantados falarem das suas ansiedades face ao futuro, velhos com “mais de 40 anos” para encontrarem outro emprego.
Histórias como as dos trabalhadores da Yazaki repetem-se um pouco por todo o mundo ocidental, das têxteis da Virgínia aos fabricantes de automóveis europeus.
Os empregos estão a “voar” para Oriente, seja para o Leste europeu ou para a Ásia. E a tendência já não afecta apenas o emprego industrial mas também mão-de-obra qualificada das tecnologias de informação e dos serviços. O resultado é o desemprego elevado, sobretudo na Europa, e a diminuição dos salários, que é particularmente evidente nos Estados Unidos, apesar dos anos de crescimento económico. O movimento é imparável e com ele sobe de tom o debate sobre a globalização.
Este ano, o Fórum Económico e Mundial, que reúne em Davos a nata da elite empresarial e política à escala mundial, e que é suspeito de fazer a apologia da globalização, incluiu na agenda precisamente um repto aos empresários e aos líderes mundiais para assumirem e discutirem os efeitos negativos do processo. Porque, apesar do crescimento que tem induzido a nível mundial e de ter contribuído para retirar milhões de pessoas da pobreza nos países em desenvolvimento, os efeitos positivos da globalização não têm sido distribuídos de forma equitativa, nem entre as nações nem entre o capital e o trabalho. E o resultado é um cepticismo crescente entre a opinião pública ocidental quanto às virtudes do comércio livre e o aumento da pressão para a reintrodução de barreiras comerciais.
Que tem surtido efeito. Esta semana, seis senadores norte-americanos apresentaram uma proposta de lei para impedir as importações de vestuário e outros bens produzidos em fábricas que não respeitem os direitos sociais dos trabalhadores. Que se seguem às restrições à entrada de têxteis chineses, aplicadas tanto pelos Estados Unidos como pela União Europeia. Ou às medidas anti-dumping impostas pela UE ao calçado de couro proveniente da China e do Vietname. E ao impasse nas negociações para o aprofundamento da liberalização, no âmbito da Organização Mundial do Comércio.
Que os poderosos do mundo reunidos em Davos tenham consciência do problema é um bom sinal. Porque, se o mundo precisa da globalização, torna-se evidente que precisa igualmente de medidas que apoiem os que, conjunturalmente, saem prejudicados. E já não basta o discurso das vantagens enquanto consumidores, porque não há descidas de preços de bens e serviços que valham a quem fica sem rendimento.
Nem o discurso dos benefícios do longo prazo porque, no longo prazo, estaremos todos mortos.
A Europa foi rápida a inventar uma palavra para enfrentar o desafio. Mas o modelo da flexigurança, que associa maior flexibilidade do mercado do trabalho com níveis superiores de protecção social, e que tem produzido bons resultados nos países nórdicos, não passa ainda disso mesmo, duma palavra. Aqueles que perdem o emprego precisam de mais do que palavras: precisam de formação e de políticas activas que promovam o seu regresso ao mercado de trabalho.
Mas não precisam de medidas proteccionistas.


Luisa Bessa

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