terça-feira, 18 de setembro de 2007

Uma Suíça bem menos conhecida

Os angolanos formam uma pequena comunidade dentro da Suíça. Apenas cinco mil pessoas, das quais metade com a situação regularizada e a outra metade requerentes de asilo, ainda da época da guerra civil, e clandestinos sem papéis.
Mesmo assim, os angolanos mereceram destaque na imprensa local, em consequência de uma frase pronunciada sobre eles por Ueli Maurer, presidente do principal partido suíço, o Partido do Povo.
A frase, reproduzida pelo jornal Le Temps, o mais importante da Suíça francesa, provocou irritação nas associações Angolanos na Suíça e Gerações Angolanas na Suíça. A embaixada de Angola na capital do país, Berna, decidiu não responder nem enviar qualquer protesto pela imprensa, a fim de evitar polêmica.
Na frase provocadora, Ueli Maurer afirma: “Apoiar a igualdade de oportunidades significa, na verdade, fazer retornar os alunos bem dotados ao nível de angolanos requerentes de asilo”.
Teria sido um lapso do dirigente do partido do ministro da Justiça, Christoph Blocher? Nada de se estranhar, pois o ministro Blocher também é conhecido por pequenas frases, geralmente contrárias à imigração e aos estrangeiros, que pronuncia em comícios ou nos encontros com membros do seu partido.
A última delas foi uma referência ao artigo do Código Penal suíço que incrimina os negacionistas do holocausto dos judeus e dos armênios, pronunciada numa visita à Turquia (responsável, no início do século passado, pelo genocídio dos armênios). “Esse artigo me dá dor de barriga”, disse Blocher, que, no seu retorno, prometeu trabalhar pela revogação da lei antiracista. O seu partido acha que essa lei protege demais os estrangeiros, contra os quais não se pode fazer críticas sob pena de processo. Isso, porém, não tem impedido ao Partido do Povo criar cartazes eleitorais, nos quais os estrangeiros sempre aparecem como ameaça pública.
O último desses cartazes mostra três ovelhas brancas em cima de uma bandeira suíça, escoiceando uma ovelha preta e jogando-a para fora da bandeira. A Liga contra o Racismo já entrou com um processo contra esse tipo de propaganda eleitoral, digno da época nazista de Goebbels.
A outra hipótese é de que as frases do líderes do Partido do Povo não sejam destinadas à divulgação pela imprensa, mas visem um público bem determinado – seus membros e simpatizantes.
Corrobora essa interpretação outra frase pronunciada, há algum tempo, pelo mesmo Ueli Maurer, afirmando que “as mulheres deveriam ficar em casa para cuidar de seus filhos”.
A frase provocou escândalo nos meios progressistas mas teve excelente acolha entre os membros do Partido do Povo.
O presidente do Partido do Povo reafirma também que nunca os suíços deverão entrar na União Européia e rejeita a denominação de extrema-direita, pois considera seu partido liberal e conservador.
Afirmação difícil de aceitar, diante das iniciativas do Partido do Povo contra a naturalização dos imigrantes, em favor da retirada do passaporte suíço de imigrantes autores de delitos, contra a construção de minaretes muçulmanos na Suíça, pela revogação da lei anti-racista e descriminalização dos negacionistas. Isso sem citar os cartazes de propaganda eleitoral do Partido do Povo considerados racistas pelas organizações de defesa dos direitos humanos.
Por Rui Martins - de Berna

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