segunda-feira, 17 de setembro de 2007

Proteção que vem do mar


O Instituto Oswaldo Cruz (IOC), em parceria com a Universidade Federal Fluminense (UFF), a Fundação Ataulpho de Paiva e a Saint George’s Medical School, de Londres, iniciará em fevereiro testes de uma substância com atividade potencial contra o vírus causador da Aids.
Os estudos serão feitos tanto em animais de experimentação quanto em células e tecidos humanos. O composto poderá vir a ser a substância ativa de um microbicida com potencial para prevenir a transmissão do HIV. Extraído de algas marinhas de origem nacional, o componente básico, caracterizado como um dolabelano diterpeno, foi isolado em 2002 por um grupo de químicos da UFF, os quais comprovaram também a capacidade de inibir a enzima transcriptase reversa do HIV-1.
A partir dessa descoberta, outra equipe, dessa vez do Laboratório de Imunologia Clínica do IOC, norteada pela característica do vírus HIV de se multiplicar dentro de células-alvo como linfócitos TCD4+ e macrófagos, iniciou estudos para avaliar a ação do dolabelano diterpeno na inibição da replicação do vírus da Aids.
“Depois de infectar células humanas, acrescentamos o dolabelano e analisamos se o vírus havia se replicado na presença do composto. Verificamos que a replicação era fortemente inibida (entre 90 e 95%) tanto nos linfócitos T quanto nos macrófagos”, disse o imunologista Dumith Chequer Bou-Habib, que liderou os estudos da inibição da infecção pelo HIV-1 em células humanas no IOC, à Agência FAPESP.
Na nova fase da pesquisa, começarão em fevereiro os testes de toxicidade animal, para saber se haverá alterações renais, hepáticas e metabólicas. Os pesquisadores esperam também obter bons resultados nos testes de toxicidade para tecidos humanos.
Serão realizados testes em fragmentos de tecido humano do cérvix uterino, retirados por biópsia e mantidos vivos em cultura em laboratório. Essa técnica, denominada explante, é disponível somente na Inglaterra. Por isso essa etapa da pesquisa será realizada no Centro de Testagem de Microbicidas da Divisão de Doenças Infecciosas do Saint George’s Medical School. Para mulheres
A colaboração com o centro de pesquisas inglês trará outros benefícios, uma vez que o projeto inclui a montagem de um centro de testagem de microbicidas no Brasil, a partir da transferência de tecnologia, como a do explante.
“Um microbicida genuinamente nacional traria uma economia de recursos imensa ao país, uma vez que não haveria a necessidade de pagamento de royalties às indústrias farmacêuticas internacionais”, afirma Dumith.
Para o cientista, ao lado do avanço científico-tecnológico que representa, o desenvolvimento de um microbicida anti-HIV seria mais um componente na estratégia de proteção contra a Aids – até hoje, desde a descoberta do vírus, há mais de 20 anos, o único método preventivo eficaz contra a doença é o uso de preservativo.
“O método não está sendo desenvolvido para substituir o preservativo. O microbicida é uma forma medicamentosa direcionada a mulheres, especialmente aquelas cujos parceiros rejeitam o uso do preservativo ou que vivem em culturas mais tradicionais e repressoras”, observa o pesquisador.
Atualmente, testes pré-clínicos de um microbicida anti-HIV estão sendo feitos na Europa e nos Estados Unidos. A equipe brasileira publicou artigo sobre a inibição do HIV na revista Planta Medica (volume 72, março de 2006), veículo oficial da Society for Medicinal Plant Research editado na Alemanha.
O artigo Inhibition of HIV-1 replication in human primary cells by a dolabellane diterpene isolated from the marine algae dictyota pfaffii, de Cláudio Cirne-Santos (Fiocruz e UFF), Dumith Chequer Bou-Habib e Luiz Roberto Castello Branco (Fiocruz) e Valéria Teixeira e Izabel Frugulhetti (UFF), pode ser lido por assinantes da Planta Medica em http://www.thieme.de/fz/plantamedica

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