terça-feira, 18 de setembro de 2007

PORQUE É QUE SE TEM QUE FALAR INGLÊS EM MADRID?


Quando se desce a Castellana e se sente o perfume que agita a capital espanhola, percebe-se facilmente que a "movida" de que Tierno Galvan fez o seu mote de gestão nos idos anos de 80 e 90 numa Madrid que teimava em não parar, já não mora aqui.
São outros os tempos que moldam uma Espanha de perfil pragmático que se assume como "plataforma de inserção global" nas áreas económica e cultural e por isso importa saber ler os sinais que do país vizinho nos chegam de forma permanente, com um sentido de "criatividade inteligente" que tão bem Miró personalizou como o espírito dum povo que protagoniza um "diálogo" de cumplicidade positiva com o futuro.
Portugal e Espanha compõem uma Ibéria que no quadro da União Europeia protagoniza o difícil compromisso entre uma periferia geográfica que o pragmatismo da globalização tem acentuado e um simbolismo de "articulação estratégica" com determinadas zonas (em especial América Latina e África) onde em grande medida reside um "capital estratégico" de afirmação internacional de distinção qualitativa adicional. Num mundo cada vez mais plano, onde os índices de crescimento são liderados pelas potências emergentes (China, Índia, Brasil, Rússia, entre outros) e a União Europeia se pauta por uma "estagnação doentia", impõe-se um sentido de mudança urgente no aproveitamento dos "factores de competência distintiva" que os dois países têm à sua disposição.
O "Nacionalismo" Global
Na sociedade intercultural de Habermas em que cada vez mais nos movemos, a "identidade sociológica" que Unamuno tanto defendeu em relação a uma Espanha de forte sentido nacional deve ser internalizada como um elemento de diferenciação qualitativa no "long tail" que Chris Anderson tanto defende na sua "wired". Ou seja, Portugal e Espanha, cada um à sua maneira, deverão ser capazes de sustentar na dinâmica competitiva das nações as sua "competências centrais" como factores de "concorrência positiva natural" e desta forma anular as "divergências estruturantes" impostas por uma periferia geográfica que a dinâmica europeia não tem conseguido apesar de tudo anular.
A afirmação dum "nacionalismo" global como imagem de marca duma capacidade de eficácia e criatividade tem sido o elemento de distinção operacional de Espanha um pouco por todo o mundo. Ciente das suas "vantagens competitivas", mesmo que não validadas por Michel Porter, o país vizinho tem conseguido duma forma única assumir as fronteiras das suas capacidades endógenas, partilhadas pelos diferentes actores do tecido social (regiões Autónomas, Empresas, Universidades, Centros de Saber) e marketizadas sob uma imagem comum de identidade corporativa que de modo algum põe em causa as virtualidades da especificidade de cada território ou protagonista social. Espanha é assim claramente um "player" vitorioso no aproveitamento da "competência da nação" no quadro global.
Torna-se imperioso para Portugal saber ler os "sinais vitoriosos" que emanam do país ao lado. Não se trata de "convergência cultural" nem muito menos de "cumplicidade nacionalista". As especificidades da marca portuguesa, nas suas múltiplas dimensões, são mais do que evidentes e têm a força duma história cultural sustentada no tempo e no tecido social. O que importa é "agarrar" a atitude proactiva da afirmação positiva na concorrência global das nossas competências. Fazer da inovação, qualidade e criatividade a bandeira de afirmação de produtos, serviços, talentos, capazes de protagonizar o nem sempre fácil desafio da competitividade com todos aqueles que não olham a meios para dominar os lugares cimeiros da classificação global.
O "diálogo" entre Portugal e Espanha constrói-se dia-a-dia das relações económicas e sociais entre os diferentes actores do território. Iluda-se quem pense que o jogo do relacionamento estratégico entre os dois países se joga nas "cumplicidades por decreto" decididas em Lisboa e Madrid. A verdadeira identidade da "relação ibérica" joga-se entre o Norte de Portugal e a Galiza, entre o Alentejo e a Andaluzia, com a verdadeira participação activa e positiva de todos os que sabem que na "sociedade aberta" de Karl Popper não há espaço para aqueles que fazem dum "isolacionismo social" o seu comportamento abstracto num mundo onde não têm enquadramento.
A "ambição" da Modernidade
Espanha protagoniza de forma sustentada a "ambição" da Modernidade num quadro de renascimento global das suas competências um pouco pelo mundo fora. Trata-se claramente dum acto de "cumplicidade colectiva" da sociedade espanhola, cabendo ao Estado a função de monitorização estratégica e de garantia das condições de enquadramento das operações dos agentes no terreno. Este "acto de mudança para o futuro" que marca a Espanha de hoje sente-se na vivência diária da sociedade espanhola, animada dum "sentido de oportunidade necessário" e é visível nos inúmeros "ratings" feitos internacionalmente pelas mais diversas organizações em relação ao nosso país vizinho. Uma "ambição" de Modernidade claramente partilhada entre Madrid e as diferentes Regiões Autónomas, numa lógica de equilíbrio estratégico que sustenta a visibilidade global do país.
Portugal não pode fugir à necessidade e oportunidade duma "ambição" própria. É essencial na moderna Sociedade do Conhecimento que Portugal perceba de forma clara a mensagem de diferença que vem do lado e sustente um compromisso claro ao nível da sociedade civil quanto aos objectivos para o futuro. Assumidas as diferenças na matriz social, evidentes do ponto de vista sociológico, não fica mal a Portugal entender como oportuna e imperiosa a mensagem de resposta positiva que vem de Espanha. Afirmar as competências específicas com uma marca própria é o desafio essencial da nova modernidade que atravessa as civilizações neste novo quadro global.
Tempos de mudança. Tempos de convicção no futuro. Juan Luís Cébrian sempre se mostrou convicto no seu El País na capacidade da democracia espanhola consolidar mecanismos de afirmação global a partir da força da identidade e cultura da nação. O sucesso de Espanha é o sucesso da sociedade civil espanhola. O sucesso de Portugal é também o sucesso da sociedade civil portuguesa. Por isso, importa acreditar. Há ainda uma oportunidade a consolidar. Em Madrid a "movida" não está morta. Tem outra cor. Outro perfume. Portugal deve aproveitar a "onda" e reforçar uma cooperação estratégica decisiva para todos.

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