quarta-feira, 12 de março de 2008

ONDE ESTAO DESTA VEZ OS NEGROS CATIVOS – II

“O que nos resta será fazer uma vida miserável de nacão supersubdesenvolvida”

Voltou ontem o Sr. Thomecroft da viagem que empreendeu ao Paquistão, à Índia e ao Ceilão. A missão que levou do gabinete consistia em ouvi-los acerca da participação da cabeça do casal no Mercado Comum. Manifestaram-se esses três Estados-membros contrários à presença da sua metrópole ao lado dos seis. Alimenta o povo da Inglaterra uma particular estima pela Austrália e Nova Zelândia, que se bateram nas duas guerras com denodo ao lado do exercito metropolitano.
Estamos há quatro meses lendo aqui a repercussão que teve no Canadá e nas outras partes da Comunidade britânica o possível ingresso da Inglaterra no Mercado Comum. E debate de um vigor polemístico, o qual desperta inveja a todos nós brasileiros, que estamos como carneiros nas mãos dos Seis magarefes da Europa continental. No tentou idéia de ter visto maior apatia do que o Rio e São Paulo apresentaram, quando discuti no Senado a incorporação do Mercado Comum. Supus que reagiríamos pelo menos academicamente através de um movimento dos outros. Estados do hemisfério, também feridos pelo golpe da Europa ocidental.
Eu havia conhecido o Sr. Pinay em Paris. Ele esteve no Rio e lhe mostraram as palavras que eu havia dito no Congresso. Como tinha e tenho admiração pelo seu enorme talento parlamentar e administrativo, quis oferecer-lhe um almoço e para este convidei amigos capazes de discutir a posição do Brasil diante do Mercado Comum.
Foi o almoço um debate onde a nossa posição ficou bem defendida. Aquela seria uma das poucas manifestações em face das conseqüências da medida discriminativa contra a América Latina.
Tomaram os nossos compatriotas o mecanismo aduaneiro dos Seis como águas de flor de laranja. Não se fez maior caso de um acordo que representava esta conclusão para o Brasil se quisermos insistir em vender para os países do Mercado Comum devemos dobrar-nos aos preços africanos plus 14,6% a mais nas despesas de entrada nos países signatários. Da medida discriminatória.
Aqui chegamos ao ponto crítico da imposição à produção tropical brsileira.
Pergunta-se: encontram-se os artigos exportáveis nacionais em condições de competir com os similares africanos em qualquer mercado do mundo? Basta tomar café robusta que os asiáticos vendem, com bela apresentação,muito bem cantado, por preços abaixo de 30 centavos. A prova da superioridade das cotações do continente negro temo-la no êxito da ofensiva feita há dois anos em Buenos Aires para arrebentar-nos o suprimento de café que tínhamos a vida inteira do mercado argentino.
Se há seis nos quase tudo que o Brasil exportou era gravoso, imagine-se agora depois dos aumentos de salários, transportes, taxas de juros, impostos, etc.
Para que possamos enfrentar a produção da África na Europa dos Seis na Inglaterra, temos que trabalhar dentro de um regime de escravos. Será indispensável cortar sessenta ou cinqüenta por cento das despesas internas do homem brasileiro, a fim de que ele venha a suportar a competição dos seus concorrentes favorecidos pelos interesses da Europa Ocidental. Não vejo que o Brasil, com a animosidade que manifesta todo o dia contra os Estados Unidos, consiga viver sem a Europa. E, se os egípcios voltaram à Inglaterra
penitentes com o seu algodão na mão, por que o Brasil não haverá de querer vender o que ele tradicionalmente colocava em Londres, Paris, Hamburgo, Amesterdam, Antuérpia e Genova?
A nossa sorte está tirada. Para não perder consumidores da importância dos seis, o que nos resta será fazer uma vida miserável de naco superdesenvolvida. Desta vez os negros cativos não estão mais em Angola nem em Moçambique, mas do lado do Oceano Atlântico, que banha grande parte do continente de Colombo. Acabou-se a vida de servidão dos negros de África. Daqui por diante os negros cativos, condenados ao eito, somos nós.
A calamidade que vem de abater-se em cima do Brasil, chega numa hora dessas: o cacau a 19 centavos e o café que nas vésperas da depressão de 29, valia 27 centavos, hoje vale 35. não é possível dizer mais nada do holocausto nacional.
Tudo que é produto agrário é cotado de maneira vil, enquanto as classes liberais e o proletariado brasileiro pedem cada vez mais aumentos de ordenados e salários.

‘Assis Chateaubriand – artigo publicado em 27 de Julho de 1961’

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