terça-feira, 11 de maio de 2010

Os fidalgos do euro

Se a actual crise do euro não significar o fim da moeda única, andará lá perto. Pelo menos, representará o último capítulo de uma fase de lançamento cheia de promessas mas, também, de ilusões, imprudência e riscos subestimados.

É esta a conclusão que se tira das declarações que a líder do Governo alemão fez no Parlamento germânico, com o objectivo de "vender" aos deputados e à opinião pública os compromissos do país na ajuda à Grécia. Perante o nervosismo dos mercados, Angela Merkel não tinha outra saída que não fosse a de dar "luz verde" ao desbloqueamento do pacote financeiro recordista que vai ser suportado pelos membros da Zona Euro e pelo Fundo Monetário Internacional.

Os perigos eram enormes, como se vê pelo facto de até o plano de salvação da Grécia ser insuficiente para fazer regressar a tranquilidade. Há fortes razões para que isto suceda. Aos 110 mil milhões de euros que vão permitir aos gregos honrarem as suas dívidas, podem juntar-se mais 400 mil milhões que seriam necessários para aguentar Portugal e Espanha, e, de caminho, evitar problemas junto dos credores, entre os quais se incluem bancos alemães com as carteiras de crédito bem recheadas de dívida periclitante.

Este cenário suscita dois problemas. Primeiro: onde encontrar aquela soma e a que preço. Segundo: como agilizar potenciais novas ajudas, se a Zona Euro não dispõe de instituições com autonomia para tomarem decisões tão drásticas e as operações de resgate têm de passar pelo demorado e incerto crivo das instituições nacionais.

Noutras circunstâncias, castigar os prevaricadores seria a opção justa e óbvia. Fizeram-nas, agora paguem-nas. Na Grécia, como em Portugal, a entrada na "eurolândia" foi interpretada como o fim de um caminho, em vez de representar o princípio de um novo modo de vida. Aceder ao exclusivo clube do euro foi visto como um atestado de riqueza que dispensava o esforço de fornecer as contrapartidas devidas. O resultado está à vista e as lições têm que ser aprendidas. Se não foram a bem, terão que ser a mal.

É aqui que reentra o discurso da chanceler alemã. Se não se pode confiar nos Governos nacionais para disciplinarem as finanças e se os mecanismos de controlo e acompanhamento acordaram demasiado tarde, é porque a chamada "construção europeia" andou entretida a construir os alicerces errados.
É duvidoso que as "insolvências ordeiras" venham a resolver grande coisa. Renegociar prazos de amortização e abatimentos na dívida acumulada são o derradeiro recurso num processo de descontrolo como aquele a que se assiste actualmente e não é solução capaz de deixar os investidores sossegados. Ou se assume que o FMI terá que ser parte das soluções futuras, como aconteceu com a Grécia, ou a Zona Euro terá que criar uma instituição semelhante para dar garantias de que não estará a nadar nua quando a maré baixar. E é necessário rever os mecanismos de penalização, suficientemente dissuasivos de comportamentos desleixados na condução das políticas orçamentais.

Em qualquer dos casos, trata-se de temas que mexem com os orgulhos nacionais e com a auto-estima europeia. Mas, ou se começa a mudar já, ou se abre a "caixa de Pandora" do desmoronamento da Zona Euro. Os tempos não estão para estados de alma de fidalgos falidos.

“João Cândido da Silva”

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